Complicado...

Fui procurada por uma amiga, pessoa simples, querendo esclarecimentos sobre um seguro a receber por um acidente sofrido dentro de um ônibus.
No dia seguinte ao ocorrido, duas pessoas tocaram seu interfone, ofereceram serviços de cobrança de seguro pelo acidente, apresentaram papéis, procurações, contratos... Ela assinou. Mas não ficou com nenhum documento. Apenas telefone e nome dos captadores. Isso foi em Outubro/2010.
Agora, Janeiro/2011, sem notícias do seguro prometido e sem saber o que fazer, me pede ajuda. Normal. As pessoas costumam ligar para um profissional e não entender nada do que lhes é informado. Às vezes, pela complexidade do assunto, mas muitas outras pelo não interesse em divulgar informações.
Bom, liguei para a pretensa seguradora, ou sei lá que nome dar a um grupo de pessoas que vai na casa dos outros, no calor dos acontecimentos, recolher procurações e prometer serviços, sem deixar qualquer esclarecimento suficiente ou documentos. A informação que obtive é que os documentos já foram repassados para o corpo jurídico (hummm... xique, né?!), que está preparando a Inicial para entrar com o processo contra a empresa de ônibus.
Complicado isso... A cliente foi abordada em casa. Em Outubro/2010. Estamos em Janeiro/2011. E os advogados ainda não ajuizaram a ação. É... Em caso de sucesso na ação, será que vão repassar a ela o valor correto da indenização? Quantos foram os honorários combinados? 10, 20, 50%? Nem ela sabe e não possui documentos para verificar.
Fica aí o alerta: não assine documentos de pessoas que vão à sua casa oferecer serviços de seguro, de advocacia, ou seja lá o que for. Ainda que seja de graça. Se alguém te abordar, em qualquer lugar, pegue o cartão com os contatos do profissional e, depois, de cabeça fria, converse, informe-se, decida.
Tive um outro caso, de uma amiga, que o seguro prescreveu, com os documentos nas mãos de um advogado. Outro caso, em que também me pediram ajuda, foi de um seguro em que o advogado entregou para a parte o valor equivalente a seus honorários e ficou com a indenização (detalhe: honorários de 18 mil, indenização de 90 mil). Mais outro, em que o advogado pagou à cliente apenas 50% da indenização, como se fosse o total da causa.
Exemplos não faltam.
Não há mal nenhum do advogado ou captador te atender em sua casa ou local de trabalho. Mas depois de você ter realizado o primeiro contato e solicitado o atendimento onde lhe é mais conveniente.
Boa semana a todos!

Indignação!

Ainda hoje dói a mera lembrança da cena de uma senhora, na região serrana do Rio, que dias atrás correu risco de morte para tentar salvar seus cães e, ao final, resgatada por uma corda com a ajuda do vizinho, viu seu animal escapar de suas mãos e ser levado pelas águas. Pra mim, particularmente, a cena é horrível e sua simples lembrança me causa muito choro.

Mas a dor aumenta, muito muito muito, quando me vem à lembrança situação parecida vivida por uma cliente (amiga!) em Belo Horizonte.

Lembro do susto que levei quando meu então marido chegou em casa dia 03/11/2005 contando que no dia anterior, após uma forte chuva no bairro Jardim Alvorada, minha então conhecida e o filho dela haviam sido arrastados pela enxurrada. Contou que o menino, de 15 anos, foi tragado por um bueiro sem tampa e seu corpo sem vida localizado no dia seguinte, pelos Bombeiros, muitos quilômetros depois, na Lagoa da Pampulha, nas proximidades da Toca da Raposa. Triste! Horrível! Desesperador!

O menino era filho único e a mãe estava viúva há cerca de 12 meses... Na luta contra a enxurrada, ela sofreu algumas escoriações. Mas a dor maior, óbvio, vinha da lembrança de ser derrubada pela água, segurando o filho pela blusa na altura dos ombros, até que um volume maior de água os alcançou. Ela não conseguiu mais segurá-lo. Foi jogada para um canto da rua e ele justamente para o bueiro que não possuía tampa. A última lembrança de minha cliente era o filho gritando a palavra "mãe" enquanto sumia pelo bueiro.

Ajuizamos Ação com pedido de indenização por danos materiais e morais contra o Município de Belo Horizonte, responsável pela manutenção dos bueiros da cidade. Não podia ser diferente: ganhamos a ação, já que tínhamos uma testemunha ocular do fato, que viu que o menino gritava ao cair no bueiro; isto é, ele ainda estava vivo (se não fosse possível provar tal situação, teria sido considerado que teria morrido afogado na enxurrada, retirando a culpa do município, transferindo-se a caso fortuito, às forças da natureza, e consequentemente sem direito a indenização).

O processo tramitou por aproximadamente 4 anos e meio. Em primeira instância, a sentença entendeu que aquela mãe deveria ser indenizada em quase duzentos mil reais, entre dano moral, material e pensionamento. Mas os desembargadores de nosso egrégio TJMG entenderam que era muito. E reduziram a indenização para 52 mil reais, valor mantido após o trânsito em julgado do acórdão (ou seja, foram infrutíferos todos os recursos cabíveis por nós intentados).

Dói muito lembrar aquela senhora perdendo seu "bebê" de estimação na luta pela vida.
Dói muito imaginar a cena de minha amiga/cliente ouvindo seu filho chamar por ela enquanto era tragado para a morte.

Mas doeu muito mais a indignação de constatar que a Administração Pública nunca será obrigada a indenizar alguém em valor suficiente que a obrigue a ser mais cautelosa com a segurança dos administrados. Doeu, insuportavelmente, constatar que o Tribunal de Justiça de Minas Gerais entende como Justiça indenizar em míseros 52 mil reais a morte de um filho, por irresponsabilidade do Município.

Desculpem o desabafo,rs...
E não pensem que comparo o menino do bueiro a um cachorro... Não se trata disso, mas sim, de sentimentos que afloram ao ter conhecimento de situações em que as pessoas perdem aquilo que têm de mais valioso. E da indignação que sentimos diante decisões fundadas em parâmetros tão frágeis...

Enfim, este texto vem apenas reafirmar o quão baixas têm sido as indenizações por dano moral, devendo o cliente avaliar com cautela a relação custo x benefício de uma ação desta natureza.

Boa semana a todos!

Ação coletiva ou individual? Feira de Artesanato da Avenida Afonso Pena

A Prefeitura de Belo Horizonte lançou edital de licitação para concessão de licenças para a Feira de Artesanato da Avenida Afonso Pena. Ocorre que o edital não foi publicado de forma ampla e possui critérios que dificultam em demasia a aprovação dos expositores. Além disso, coloca em posição de igualdade novos expositores com aqueles que estão lá há mais de 20 anos, isto é, que já estruturaram sua vida, investiram em maquinário, etc etc etc.

Nesta controvérsia, de tentar garantir uma concorrência justa, várias atitudes estão sendo tomadas pela Asseap, a Associaçao dos Expositores da Afonso Pena. A referida associação apresentou ao associados um advogado, experiente e enfronhado nas questões legais pertinentes à feira. A idéia divulgada é ajuizar ação para derrubar o edital e exigir critérios justos.

Em minha experiência, em Direito Administrativo, entendo que os critérios compõem a chamada discricionariedade do Administrador Público, coisa que o Judiciário não questiona. A legalidade do ato, sim. A discricionariedade, não. Se há falhas legais no Edital, ok, serão sanadas judicialmente. Mas a questão que corresponde à discricionariedade da administração, não será analisada. Isto é, corrigindo-se as falhas legais, outro edital virá, muito provavelmente, com os mesmos critérios. E eu não vejo a associação divulgar ações se prepararando para tal. Discricionariedade se combate políticamente, não juridicamente.

Fui feirante por uns 15 anos. Minha mãe ainda é (não, meu bem, advocacia não dá dinheiro suficiente para você manter a si e seus familiares mais próximos...).

Sabemos que a Asseap ajuizou duas ações coletivas: uma ordinária (que pode tramitar até 6 anos) e um mandado de segurança (pela lei, tramitará por até 120 dias). Apesar do advogado patrocinador ter prometido uma liminar até a sexta-feira, dia 14/01, tal não ocorreu. O que pra mim não é novidade, já que não cabe ao advogado fazer promessas sobre ações de terceiros. A concessão de liminares é atribuição de juiz, com base na argumentação do advogado. Ainda que muito bem fundamentada, o pedido de liminar será livremente apreciado pelo juiz, sem possibilidade de intervenção do advogado... Para que A possa prometer que B dará uma decisão, é preciso que A esteja em coluio com B. Sim, anti-ético, mas muito necessário aos nossos interesses. A não concessão da liminar no prazo prometido demonstrou que não há essa relação entre A e B. E isto aponta uma certa precipitação (inexperiência não é, com certeza...) por parte de quem realizou a promessa, comprometendo seu marketing pessoal...

Hoje recebemos um comunicado do referido advogado (advogado da associação) conclamando os feirantes a ajuizarem ações individuais. Logo após, foi distribuído comunicado da Asseap desaconselhando as ações individuas, inclusive as propagandeadas por seu próprio advogado.

Tudo que os expositores precisavam neste momento é conflitos de interesses entre a associação que os representa e o advogado por ela contratado.

Bom, algumas coisas devem ser esclarecidas.

Primeiro, como falei, existe a questão da discricionariedade no Edital, para a qual não tenho visto ações planejadas.

Segundo, existindo ação coletiva na defesa de interesse, o advogado que propõe ação individual deve deixar claro qual a vantagem dela. Isto porquê a ação coletiva já defende o interesse de todos os associados, o que significa que a vitória que dela vier, alcançará todo mundo. No comunicado distribuído, o advogado não informa qual a vantagem de ajuizamento individual, apesar de gastar muitas linhas rebatendo atuação de outro colega. A confiabilidade e seriedade de um profissional, pode ser observada, dentre outros,  nos textos que ele divulga. Qualquer propaganda bem intencionada deve ser objetiva e esclarecedora.

Terceiro, quando há partes iguais (o mesmo feirante em duas ações contra o Município de Belo Horizonte) e o mesmo objeto da ação (o edital), será determinada a reunião das ações, sendo prevento (competente para julgar) o juiz da primeira ação, que no caso, é a ação coletiva. Em virtude disso, não consigo visualizar vantagem no ajuizamento de ações individuais por pessoas já alcançadas na ação coletiva, a não ser, claro, vantagem econômica para o profissional que ajuizará as individuais, caso ele cobre honorários iniciais.

Por tudo isso, e procurada por feirantes preocupados com sua situação, eu desaconselho o ajuizamento de ações individuais, NESTE CASO.

MAS ATENÇÃO: a conduta do cliente só diz respeito a ele; é dele o risco de agir ou não. Minha pretensão aqui é o ESCLARECIMENTO. Quer correr o risco? Acredita que vale a pena? Pague pra ver! É justo e lícito. Ajuize sua ação individual, pague um advogado de sua confiança. Mas faça isso, ciente dos riscos. A decisão é sua, porquê o risco é só seu.

Caso não queira ajuizar uma açao coletiva, vamos aguardar o resultado das ações coletivas e, independente delas, participar ativamente da Asseap, inclusive financeiramente, de modo a garantir representação idônea junto à Prefeitura, para que as decisões tenham participação dos expositores. Só isso permite interferência na já mencionada discricionariedade administrativa, item impossível de derrubar juridicamente.

Boa sorte para nós todos!