Indignação!

Ainda hoje dói a mera lembrança da cena de uma senhora, na região serrana do Rio, que dias atrás correu risco de morte para tentar salvar seus cães e, ao final, resgatada por uma corda com a ajuda do vizinho, viu seu animal escapar de suas mãos e ser levado pelas águas. Pra mim, particularmente, a cena é horrível e sua simples lembrança me causa muito choro.

Mas a dor aumenta, muito muito muito, quando me vem à lembrança situação parecida vivida por uma cliente (amiga!) em Belo Horizonte.

Lembro do susto que levei quando meu então marido chegou em casa dia 03/11/2005 contando que no dia anterior, após uma forte chuva no bairro Jardim Alvorada, minha então conhecida e o filho dela haviam sido arrastados pela enxurrada. Contou que o menino, de 15 anos, foi tragado por um bueiro sem tampa e seu corpo sem vida localizado no dia seguinte, pelos Bombeiros, muitos quilômetros depois, na Lagoa da Pampulha, nas proximidades da Toca da Raposa. Triste! Horrível! Desesperador!

O menino era filho único e a mãe estava viúva há cerca de 12 meses... Na luta contra a enxurrada, ela sofreu algumas escoriações. Mas a dor maior, óbvio, vinha da lembrança de ser derrubada pela água, segurando o filho pela blusa na altura dos ombros, até que um volume maior de água os alcançou. Ela não conseguiu mais segurá-lo. Foi jogada para um canto da rua e ele justamente para o bueiro que não possuía tampa. A última lembrança de minha cliente era o filho gritando a palavra "mãe" enquanto sumia pelo bueiro.

Ajuizamos Ação com pedido de indenização por danos materiais e morais contra o Município de Belo Horizonte, responsável pela manutenção dos bueiros da cidade. Não podia ser diferente: ganhamos a ação, já que tínhamos uma testemunha ocular do fato, que viu que o menino gritava ao cair no bueiro; isto é, ele ainda estava vivo (se não fosse possível provar tal situação, teria sido considerado que teria morrido afogado na enxurrada, retirando a culpa do município, transferindo-se a caso fortuito, às forças da natureza, e consequentemente sem direito a indenização).

O processo tramitou por aproximadamente 4 anos e meio. Em primeira instância, a sentença entendeu que aquela mãe deveria ser indenizada em quase duzentos mil reais, entre dano moral, material e pensionamento. Mas os desembargadores de nosso egrégio TJMG entenderam que era muito. E reduziram a indenização para 52 mil reais, valor mantido após o trânsito em julgado do acórdão (ou seja, foram infrutíferos todos os recursos cabíveis por nós intentados).

Dói muito lembrar aquela senhora perdendo seu "bebê" de estimação na luta pela vida.
Dói muito imaginar a cena de minha amiga/cliente ouvindo seu filho chamar por ela enquanto era tragado para a morte.

Mas doeu muito mais a indignação de constatar que a Administração Pública nunca será obrigada a indenizar alguém em valor suficiente que a obrigue a ser mais cautelosa com a segurança dos administrados. Doeu, insuportavelmente, constatar que o Tribunal de Justiça de Minas Gerais entende como Justiça indenizar em míseros 52 mil reais a morte de um filho, por irresponsabilidade do Município.

Desculpem o desabafo,rs...
E não pensem que comparo o menino do bueiro a um cachorro... Não se trata disso, mas sim, de sentimentos que afloram ao ter conhecimento de situações em que as pessoas perdem aquilo que têm de mais valioso. E da indignação que sentimos diante decisões fundadas em parâmetros tão frágeis...

Enfim, este texto vem apenas reafirmar o quão baixas têm sido as indenizações por dano moral, devendo o cliente avaliar com cautela a relação custo x benefício de uma ação desta natureza.

Boa semana a todos!

2 comentários:

Suzana Machado disse...

Adriana, seu texto traduz a dor e a indignação que todo cidadão de bem deveria sentir frente a tais situações. É duro saber que a Adm. Pública dá, e sempre dará, de ombros para qualquer situação aflitiva de seus administrados. Quem sabe um dia a Adm. Pública que é administrada por pessoas se humanize. Belo texto!

Adriana disse...

Muito obrigada, Amanda!
É verdade... Vamos esperar, né?! rs