Advogado corruptor, serventuário corrupto, cliente hipócrita.


Eu to pasmada! Sabe aquela coisa de “Me amarrota porque eu to passada!”? Eu estou passada, pasmada com um livro que acabei de ler. Nele, o autor, um advogado, conta suas aventuras, desventuras e atuação na profissão e aconselha os jovens advogados no trato com o colega, com os juízes, promotores e demais servidores da Justiça. No capítulo em que ele fala sobre a relação do advogado com os serventuários das varas, finaliza com o seguinte texto:

Portanto, leitor, preze os serventuários da justiça. Você estará com eles todos os dias. Eles movimentam, em grande parcela, o ‘aparelho judiciário’. Mais ainda: dia a dia, com o acúmulo de serviço, cada vez mais escrivães, secretárias, assessores são responsáveis por grande parcela das decisões que são ‘proferidas’ pelos juízes e promotores.”

Ora, escrivães e assessores, sim, podem “rascunhar” a decisão, mas secretárias, nunca. Além disso, qualquer profissional, em qualquer área, preza seus colegas e demais parceiros na atividade, usando da boa educação e exercendo a boa convivência. Isso basta. Mas para este autor, não. Não basta! É preciso subornar os serventuários da justiça, a fim de obter favores e com isso, favorecer seu cliente.

É propina!

Antes de concluir com o trecho que retirei do livro e transcrevi acima, o advogado conta que foi procurar um grande jurista brasileiro, a fim de pedir um parecer sobre um determinado caso. Numa das vezes em que esteve com tal jurista, foi convidado a ir com ele ao Tribunal para conversarem no caminho. Ao saírem do escritório, ele assustou-se com o colega carregando duas sacolas cheias. Eram perfumes que foram distribuídos para todas as secretárias de todos os desembargadores daquele Tribunal, a fim de que elas se mantivessem dispostas a colaborar com ele, em caso de necessidade. Em claro e bom português, PROPINA!

Estou pasmada! Sim, isso acontece, a gente sabe e sempre me irritei muitíssimo com esse tipo de conduta de advogados que presenteiam serventuários e distribuem convites para festas e outras coisas mais e os tratam como amigos íntimos. Mas ler isso num livro como aconselhamento de conduta para advogados é de um absurdo tal, de uma falta de ética tamanha, que deveria ser severamente punido por questões óbvias. Quer dizer, agora tenho que incluir nos honorários pagos por meu cliente o valor de presentinhos que pretendo distribuir no Judiciário para estreitar laços e pode obter vantagens nos processos em que atuo?

É corrupção! 

Há dois dias pensando nisso, indignada, chego à conclusão que errada estou eu! Ontem mesmo fui questionada pela cliente de um colega, perguntando se não teria como dar uma “cutucadinha” no juiz para soltar mais rápido o processo dela. Ninguém quer saber o que fazer para o Judiciário ser mais ágil, querem apenas descobrir como fazer o seu processo andar mais rápido e ter o resultado que se deseja. Não importa que você não tenha razão, importa ganhar o caso e fazer valer a vontade do cliente. Cliente não está nem aí, caso esteja prejudicando a outra parte. Como sempre digo, é muito comum, quando se recorre ao judiciário, buscar vingança ao invés de Justiça.

É hipocrisia!

Fica aquela sensação que todos somos corruptores e corrompíveis. Estamos sempre dispostos a fazer qualquer coisa que nos garanta determinada vantagem. E aceitamos favorecer a quem nos “agrada”. Talvez seja da natureza humana isso de abrir mão da ética por qualquer sorriso bobo. Sou mesmo um pouco hobbesiana, isto é, assim como Thomas Hobbes, creio o homem é “mau” por natureza. Mas, caramba, estamos vivendo um momento em que todos clamam justiça contra a corrupção no meio político e exigimos justiça sentando no próprio rabo?

E se a gente observa mais um cadinho, com mais frieza, vê que realmente todo cliente quer sim que o advogado use sua “influência” em favor de seu caso. Ele prefere procurar o advogado que é bem relacionado nos tribunais. Mas é hipócrita, pois não está disposto a pagar honorários suficientes para manter esse “bom relacionamento”.

Tá! As pessoas são hipócritas. É da natureza do ser humano querer levar vantagem a todo custo. Mas, caramba, um advogado ensinar num livro que devemos oferecer presentinhos aos serventuários ultrapassa o cúmulo da cara de pau.

Me amarrota, gente! Me amarrota porque eu to passada!!!


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