"Entracação" nem sempre é a solução

Semana passada teve reunião de condomínio. Assembleia extraordinária para decidir sobre honorários periciais numa ação judicial que ajuizamos em 2013 contra uma construção no terreno ao fundo do nosso prédio. Quando vi chegar um vizinho que tem 6 unidades no edifício,  gelei. Empresário de sucesso, se diz ocupadíssimo e nunca participa de nada. Nas raras vezes em que aparece, vai contra tudo e todos e nunca fala nada com nada. Seu discurso se refere unicamente ao que lhe é interessante, desprezando sem pudor o interesse da coletividade. Sua presença é um risco, porque apesar de sermos 64 unidades, raramente aparecem 10 condôminos nas assembleias. Se ele sozinho é dono de 6, tem 6 votos e aí já viu o perigo, né?! E desta vez não foi diferente.

Ele: - Gostaria de registrar minha indignação por terem ajuizado a ação antes de me consultar. Gostaria de ter opinado sobre a inviabilidade da mesma e sobre os honorários do advogado.

Eu: - Oi?! Cuméquié? Na verdade...

O Síndico: - Adriana, faço questão de responder. Fulano, a decisão para o ajuizamento da ação foi tomada em assembleia para a qual todos foram convocados, bem como para a assembleia que discutiu o acatamento dos honorários do advogado à época. Você não compareceu porque não quis.

Ele: - Ah! Então não vi. Peço desculpas.

O Síndico começou a explicar a necessidade de acatarmos o pedido de perícia judicial requerido pela outra parte, bem como de contratarmos um perito assistente para acompanhar a perícia. Deixou claro que isso não garante o ganho de causa, mas que recusar a perícia é um risco e blá blá blá.

O tal vizinho: - Acho que já enfiamos dinheiro demais nesta ação e deveríamos parar por aqui.

Eu: - Oi?! Cuméquié? Você quer...

O Síndico: - Peraí, Adriana. Fulano, você não tem acompanhado as discussões, não participou das assembleias, não está por dentro dos prejuízos causados ao condomínio. De acordo, com laudo que fizemos à época, foram mais de 100 mil de danos materiais. Não cabe mais querer parar a ação. É totalmente incabível.

Ele: - É a minha opinião...

O Síndico continuou a tirar as dúvidas dos demais presentes. Na hora de votar, ele foi contra a perícia, mas perdeu, apesar de seus 6 votos. Ao todo éramos 8 a favor.

Tudo resolvido, tudo assinado, tudo acabado, lá vem o empresário bem sucedido, mas chato e tapado até onde não cabe mais, criar caso.

Ele: - Gostaria que registrasse o nome de todos os votantes na ata.

Eu: - Registramos as unidades e é o suficiente.

Ele: - É que vou questionar em juízo, porque inquilino não pode votar sobre este assunto.

Eu, engasgada: - Oncetaveno inquilino aqui???

O Síndico: - Não há inquilinos presentes. Todos os votantes são proprietários e residem nas unidades.

Ele: - E ela?

A moça para quem ele apontou: - Sou dona, moço.

Ele: - Ah, tá. Ok, então.

Eu já tinha virado as costas, fingindo me ocupar com alguma coisa, para não procurar briga com o dito cujo, mas não aguentei. Estufei o peito, dedo em riste,  soltei em alto e bom som:

- Vá pros inferno! Filho d...!!! Nunca participa de nada, só enche o saco. Não fala nada que presta, não agrega, não soma. Vai tomar  ...!!! Ordinário! Pega sua opinião e enfia sabe onde? Aí mesmo onde você pensou! Você não vale nada! Só pensa no seu umbigo, só enxerga seu umbigo! BABACA!!!

Pena que ele não viu nem ouviu nada, porque já tinha ido embora rsrsrs...

Mas reunião de condomínio é sempre assim, uma chateação. Tudo por nossa incapacidade de mediar conflito, de buscar uma solução para a coletividade, de deixar de lado nosso interesse particular.

E isso não se reflete apenas nas assembleias. O Judiciário está abarrotado de causas que poderiam ser resolvidas à base do bom senso, da conciliação, da boa vontade, do interesse no bem comum. A gente prefere que um estranho (o juiz) decida nossa vida, a abrir mão de alguma coisa para evitar o conflito. E depois ainda reclamamos que o juiz não foi justo. E aí fica como o meu vizinho chato, reclamando, falando abobrinha e eternamente recalcado.

Gente, se nós não mudarmos nossa postura diante da vida, diante da qualidade de vida que queremos para nós e nossa família, nunca haverá juiz justo ou Judiciário capaz de nos dar as decisões no prazo em que precisamos.

As Igrejas, as seitas, estão todas lotadas, mas cá fora, ao invés de exercitarmos o que aprendemos nelas, pelo contrário, alimentamos o conflito e não falamos noutra coisa que não seja a ameaça de que “Vô entracação!!! Vô pô na mão du divogadu!!!” E lá vai uma ação atrás da outra. E não há espaço suficiente no fórum para tantos processos.

Bom, fica a dica! Na grande maioria das vezes, quem abre mão de algo ou dá um passo atrás é quem mais ganha.


Muita luz para todos nós!

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