Não somos éticos, mas podemos aprender a ser.

" ‘Não concordo com o parabéns ao Cunha nem com citação a torturador, MAS...’ Então concorda!

Quando li isso no mural do primo Ricardo Moraes no Facebook, imediatamente lembrei de incontáveis “mas” que a gente tem na vida e não tive como não relacionar isso à falta de ética intrínseca em nós. Carregamos a essência das contradições. Explico. Mas, antes, exemplifico.

- Eu sou católica, MAS frequento cartomante.
Então você não é uma boa católica.

- O Pastor disse que é pecado, MAS quem sabe de minha consciência é Deus.
Então você não é uma boa cristã.

- Agi mal, MAS tive motivos pra isso.
Então você sempre tem motivos para agir mal.

- Eu sou ateísta, MAS morro de medo de espíritos.
Então você é um ateu de meia tigela (óia a carapuça).

- Amo minha esposa, MAS adoro transar com a vizinha.
Então você não sabe o que é amar.

- O partido determinou esta decisão, MAS me abstenho.
Então você está se manifestando a favor daquilo ao qual seu partido é contrário.

- Respeito crianças especiais, MAS não tenho saco para dar atenção a elas.
Então você não respeita crianças especiais.

Faz tempo que fui num evento, que me deixa ainda hoje de queixo caído quando lembro da falta de ética de dois palestrantes. Ambos, mega competentes, tecnicamente falando. Foram convidados como representantes das instituições onde atuam profissionalmente.  Mais da metade do tempo destinado a cada um deles, foi usado para apontarem de maneira grosseira e irônica falhas das instituições representadas por eles. Fiquei pasmada! Ainda fico. O resultado, além do reforço negativo para a imagem da entidade que eles deveriam ajudar a estruturar e enaltecer, foi um grande prejuízo para quem assistia ao evento, já que precisaram “pular” conteúdo para cumprir o tempo programado. Inaceitável!

Esses dias, um apresentador de tv foi afastado da emissora por ter reclamado ao vivo da interrupção de seu programa para apresentação de notícias urgentes. Foram 1:30 hora de reportagem perdida. Ele tinha razão, em especial ao lembrar o trabalho, o carinho com que a matéria havida sido feito e a importância dela para o entrevistado, correto? Errado! Não se reclama de alguém a quem se deve obediência hierárquica em público! Não se questiona ordem de um superior, a não ser com ele. Ele foi tristemente antiético.

Enquanto servidora estadual, tenho determinados valores que conflitam com os valores que defendo como usuária dos serviços do Estado. Como advogada, tenho determinados valores que conflitam com aqueles que defendo como pessoa fora do espaço jurídico. Meu esforço é sempre tentar conciliar todos eles. E vou morrer tentando. Porém, em alguns momentos sou obrigada a me posicionar. E aí, minha conduta e discurso vai depender do papel que desempenho naquele momento. Tem que ser assim. E mesmo ciente disso, costumo falhar. Mas como disse, morrerei tentando acertar.

Quando se faz parte de algo, temos por obrigação cumprir as regras daquilo. E defende-las. Não é justo, não é certo, não é ético, sabotarmos as instituições às quais pertencemos por livre escolha. A flexibilização de normas é algo que deve ser discutido antes de exercido por qualquer um, por um motivo particular.

Se você se diz religioso, deve cumprir com rigor as regras da Igreja à qual pertence. Se você age mal, sempre vai ter um motivo pra continuar agindo assim. Se você (eu!) não crê no Divino, não pode sucumbir a ele. Se você ama, você dever ser fiel às atitudes que enobrecem este sentimento. Se você faz parte de uma associação, seja política, seja humanitária, você deve cumprir o estatuto e as decisões dela. Se está em sala de aula, deve respeitar as ordens do professor.

É direito seu não concordar com um monte de coisa. Neste caso, você tem algumas alternativas. Primeira: demonstrar sua insatisfação e só agir diferente se tiver obtido permissão para descumprir aquela obrigação. Segundo: iniciar uma discussão entre seus iguais, para mudança de valores e paradigmas. Terceiro: sair daquela situação ou instituição cujas regras você não concorda em obedecer.

Mas normalmente não se faz nada disso. Apenas age-se diferente do que deveria fazer, ao argumento de que tem motivos para tal. E isso é o tipo de atitude que se propaga nocivamente naquele grupo, naquela comunidade e destrói a credibilidade dela. São os “mas” da vida. As contradições que usamos como desculpas para nossa amoralidade (nossa falta de moral), nosso desrespeito àquilo em que dizemos acreditar, nossa falta de ética perante tudo que dizemos ser.

Simplificando a questão, já que não é minha área, posso informar que Ética é a propriedade do caráter da pessoa. Ser ético é agir de modo que não se prejudique os outros. E isso é analisado e avaliado, de acordo com suas atitudes e seus discursos. Filosoficamente, ética é a coerência entre o posicionamento do indivíduo e seus valores. Você pode ter valores só seus. Mas se decidir pertencer a um grupo, tem que assumir os valores daquela instituição, caso contrário estará prejudicando o estabelecimento daqueles princípios. Profissionalmente, ser ético, por exemplo, é agir com perícia (ser preparado, qualificado), com prudência (ter domínio do que faz) e com diligência (estar sempre disposto). Não agindo assim, torna-se um incompetente. E agir sem competência é antiético.

Mas e se insistimos em agir confrontando a ética, seja moral, seja institucional, seja profissional? Na maioria das vezes, você só vai enfrentar a sua consciência, já que é típico de nós, fazermos escondidinho quando se trata de descumprir normas de conduta. Mas se isso vier extrapolar os limites da sua privacidade e atingir alguém ou alguma instituição, as consequências não serão bacanas.

Você pode ser repreendido moral e socialmente por aquele grupo que se sentir prejudicado por seus atos. Pode vir a ser penalizado ou expulso da instituição cujos valores desrespeitou. E, ainda, pode responder juridicamente por tudo isso.

No Direito, a falta de ética é traduzida em diferentes condutas, cada uma penalizada de acordo com o prejuízo causado (criminal) e que pode também ensejar reparação do dano (cível, indenização). Maledicência (calúnia, difamação), omissão, negligência, imperícia, imprudência, agressões físicas ou verbais (injúria), desrespeito a direitos (discriminação), descumprimento de dever da profissão, enfim, são muitas as condutas que podem ser traduzidas como atos ilícitos punidos pelo Direito, sem prejuízo das sanções administrativas. É claro, que sempre é saudável repensar uma atitude, pedir desculpas, passar por cima de algo para um bem maior. E para tanto, convém nunca esquecer que ações antiéticas têm repercussão jurídica sempre em desfavor de quem assim agiu.

Como Adriana e como cidadã, normalmente estou disposta a ir até as últimas consequências defendendo meus princípios e ideais. Como servidora ou como profissional jurídica, nem sempre isto é possível, pois aí estão em jogo os interesses das instituições nas quais me inseri e onde quero permanecer.

E você? Jura mesmo que uma reforma política vai moralizar o país? Tem certeza que ética é algo que se discute, exige e pune fora de casa? Acredita de verdade que seus motivos agregam ética em suas incoerências? Considera realmente que pode continuar fingindo agregar valores morais positivos a seus filhos, mesmo dando exemplos de intolerância e preconceito? Oh, dó docê, viu, benzin?!


Muita luz para todos nós! 

Nenhum comentário: