Não
tiro a razão das pessoas quando reclamam que estudar Direito é chato. Eu adoro,
mas de fato, não é tão simples quanto deveria ser. E quando cai em concurso de
nível médio então, a galera pira. Já dei aula de legislação para concurso de
nível fundamental. Imaginem! Não é fácil simplificar o Direito para
escolaridades mais baixas, quando se trata de concorrência em concurso público,
que exige um raciocínio mais apurado. Mas a gente consegue!
Houve
uma época, melhor dizendo, era uma vez, uma escola que me chamou para dar aulas
de Direito Constitucional para uma turma num curso preparatório para concurso
do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, para nível médio, o segundo grau da
época. Mas a turma foi formada muito tempo antes de abrir o edital e o curso
então foi longo, me dando a oportunidade de usar técnicas que demandam um pouco
mais de tempo para o aprendizado, mas que facilitam a memorização da matéria.
Foi o
dono do cursinho que me deu o gancho e eu dei continuidade no desenvolvimento da
ideia. Não sei quem originalmente pensou nisso. Adaptando aos dias atuais, é o
seguinte:
Vamos
supor que na tragédia do rompimento das barragens da Samarco, em Bento
Rodrigues, distrito de Mariana/MG, a casa do Lucio tenha sido derrubada e ele
tenha perdido tudo. Lucio e sua família precisam agora recomeçar, partir do
zero. Todos os valores materiais se perderam e os emocionais, psicológicos
estão seriamente agravados. Tudo precisa ser revisto, repensado, refeito.
Quando
se faz ou se refaz a constituição de um país, é mais ou menos isso que
acontece. Uma revisão dos valores com novos ideais, novos pensamentos, novos
objetivos. Não importa porque motivo isso acontece, se por algum golpe de
estado ou por clamor popular, importa que as normas que até então vigoravam não
satisfazem mais e é preciso reescrever os valores do país.
Então
vamos acreditar que a casa do Lúcio é o Brasil e vamos ajudá-lo a
reconstruí-la. Para isso, precisamos definir as regras, o papel de cada um,
suas tarefas, seus direitos, seus deveres, tudo, tudo. Essa definição de regras
na casa do Lúcio é a Constituição.
Em seu art. 1º, a Constituição Federal
informa quais valores, quais fundamentos serão observados na reconstrução desse
país, aqueles princípios que irão dar sentido a todo o resto das normas e das
decisões a serem tomadas.
Art. 1º A
República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e
Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito
e tem como fundamentos:
I - a soberania;
II - a cidadania
III - a dignidade da pessoa
humana;
IV - os valores sociais do
trabalho e da livre iniciativa;
V - o pluralismo político.
Parágrafo único. Todo o poder
emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente,
nos termos desta Constituição.
Assim,
optou-se por um país onde o povo escolhe seu representante (República) e a
família de Lucio o escolheu como o “governante”. Também optaram por um tipo de
família (Estado/nação) em que todos os membros unem forças para o
desenvolvimento daquele grupo (federação), que não poderá ser desfazer para
compor outros grupos familiares (união indissolúvel). Será um país, uma família
(Estado) onde o povo toma as decisões (democracia) e onde haverá regras
definidas (Direito) e claras para que se possa viver bem e resolver conflitos
naquela casa/país/nação.
Assim,
será uma família, uma nação que respeitará sempre os princípios da soberania
(dentro daquele país, daquela casa, o povo/família é que determina o que é
melhor para si, sem interferência estrangeira), da cidadania (todos
participam direta ou indiretamente das decisões), da dignidade da pessoa humana
(respeito máximo às pessoas), dos valores sociais do trabalho e da livre
iniciativa (o trabalho dignifica o homem e ele pode escolher como deseja
sustentar a si e aos seus) e do pluralismo político (não há democracia sem
pluralidade de ideais). Estes são os pilares da nova casa do Lúcio, que se
chama Brasil.
Ok. Mas precisamos
governar este país, precisamos desenvolver as tarefas da casa. Quem vai fazer o
quê? O art. 2º responde,
distribuindo tarefas, antigamente chamadas de Poderes, mas hoje reconhecidas
como funções:
Art. 2º São Poderes da União,
independentes e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário.
Caberá
ao pai, o Lúcio isso, à mãe aquilo, aos filhos aquilo outro, e poderão ainda
ter auxílio dos avós ou tios ou quem mais seja agregado daquela família. Por
exemplo: ao Lúcio caberá governar a casa (Executivo, cumpre as leis em prol da
paz social). À esposa dele caberá definir as regras da casa (Legislativo, faz
as leis). Já a mãe de Lúcio será a
responsável por fazer as regras serem cumpridas (Judiciário, aplica as leis).
Os filhos e demais agregados (o povo, a nação, a família) contribuirão para
cada uma destas funções, enquanto destinatários delas.
Não vou
aqui falar de artigo por artigo da nossa Constituição. São 250! A ideia é
mostrar que dá pra brincar com o direito, tornando-o menos distante de seus
destinatários. Basta termos tempo suficiente para o estudo da matéria. Como nem
sempre isso é possível, uma forma que criei para fugir do lugar comum foi a
confecção de palavras cruzadas com os artigos, como exercícios de fixação.
Enfim, direito para leigos sem didática é judiação hehehe.
Mas,
vamos voltar à brincadeira, para não perdermos o fio da meada.
A gente
já sabe quais são os pilares da casa nova (art. 1º), bem como as funções de
cada membro da família (art. 2º). Mas para que, com que finalidade, estamos
revendo as regras e não meramente copiando as anteriores? O que queremos com isso?
Para quê estamos reconstruindo a casa do Lúcio? Aí vamos lá para o art. 3º da
Constituição e ele nos informa quais os objetivos da nova ordem legal
(erradicar a pobreza, construir uma sociedade livre, etc.). Beleza! Mas não
estamos sós no mundo. Fazemos fronteiras com outros Estados, outros países,
outras nações. Como será a relação do Brasil com o resto do mundo, isto é, como
será a relação da família do Lúcio (Brasil) com seus vizinhos (demais países)?
Quem responde é o art. 4º, determinando que tais relações devem se pautar pela
defesa da paz, pela concessão de asilo político, pelo repúdio ao terrorismo,
dentre outros.
Ótimo!
Já “desenhamos” a casa do Lúcio, sua vizinhança e seus interesses. Agora vamos
cuidar das pessoas desta família.
O art.
5º (direitos e garantias individuais) nos indica então quais os direitos de
cada membro da família, individualmente, preservando-o enquanto pessoa,
resguardando sua imagem, sua integridade física, e outros, mencionando
inclusive, o que ele deve fazer se não tiver seus direitos respeitados
(remédios constitucionais, entre eles, o mandado de segurança).
Já as
relações sociais, a interação entre os membros desta família, se dará com base
no art. 6º (direitos sociais – saúde, segurança, educação...). Como eles
precisam trabalhar para se sustentar, os arts. 7º ao 11, os protegem da
exploração econômica, concedendo-lhes direitos trabalhistas.
E como
serão tomadas as decisões nesta casa do Lúcio chamada Brasil? E se um vizinho
(o estrangeiro) vier morar com eles? As regras para isso estão nos artigos
relacionados à cidadania (prerrogativas da família do Lùcio e de quem mora com
eles) e aos direitos políticos (participação nas decisões), previstos nos arts.
12 ao 17.
Do art.
18 em diante, a Constituição cuida da organização administrativa da “casa” e
detalhando o papel de cada um daqueles membros a quem conferimos as funções
previstas no art. 2º.
Enfim,
adooooooro constitucional, especialmente quando se trata de ensinar para
leigos.
E fica
a dica, para você que precisa estudar para concurso e para você que ensina para
concursos: sempre há uma forma de tornar o estudo do Direito mais leve, mais
simples, mais compreensível, mais próximo da vida das pessoas.
Aliás,
fica a dica para todo mundo: sempre há uma maneira de conduzir a vida de
maneira mais leve. Sempre!
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