Quem ri por último, ri melhor

Alguns dias atrás, publiquei o texto Silêncio!, sobre como proceder para fazer valer a Lei do Silêncio. Nele, contei o que passei no meu prédio quando certa madrugada, aproveitando a ausência dos pais, uma jovem resolveu dar uma festa em casa. Após reclamação de alguns condôminos, sem sucesso nas tentativas de conversa, chamei a polícia e fomos todos para a delegacia. Saímos de lá já intimados para audiência preliminar que ocorreu 29/04/2016, no Juizado Especial Criminal de Belo Horizonte/MG.

Ao chegar no Juizado, me deparei com os jovens da festa e a moradora minha vizinha. Todos me acenaram e ela, inclusive, sorrindo ironicamente, aquele risinho de deboche. Sorri de volta.

Foram quase 4 horas de audiência: das 14:20 até às 18:00 horas. Mega cansativo. Eram 17 pessoas arroladas como autores da contravenção penal de perturbação ao sossego. Dois deles também por desacato e desobediência e, destes, um por resistência à prisão. Este teve o processo encaminhado à Justiça Comum, já que a soma das penas ultrapassa 4 anos, tornando incompetente a Justiça Especial.

Para 15 deles o promotor ofereceu acordo de R$ 400,00 de multa ou 3 meses de prestação de serviço voluntário à comunidade. Uma das moças, como responde também por desacato e desobediência, a multa seria de R$ 500,00 ou 4 meses de serviço comunitário.

A galera pirou! Mas pirou geral. E eu tendo que segurar a cara de “Bem feitooooooooooooooooooooooooooooooooooo!”.

Foi muita conversa, muitas dúvidas, muitas indignações, muito isso e muito aquilo. Um defensor público foi designado para orientá-los. Três, entre eles uma estudante de Direito, diga-se de passagem a mais topetudinha de todos, recusaram o acordo. Foram então conversar em particular com o defensor. E demoraram muito neste papo. Ao retornarem, um deles se manteve firme na recusa. E ele tinha razão. Estava dormindo no apartamento e não poderia responder pela perturbação ao sossego. As duas moças, incluindo a topetuda graduanda, voltaram mansinhas aceitando o acordo. Foi quando não consegui segurar o riso. Mas logo me recompus e continuei caladinha, como estava, assim permanecendo toda a audiência, respondendo apenas quando me perguntavam algo. Quem me conhece sabe o quanto sofri sem poder palpitar!

E o caso ficou assim para a dona da casa e seus convidados:
- 1 vai responder na justiça comum; adorei: vai ter uma trabalheira danada;
- 1 recusou o acordo e vai continuar respondendo ao processo; vai se dar bem, pois possui testemunhas de que dormia durante a algazarra;
- 6 optaram pelo pagamento da multa e encerramento do processo; adorei, pois irão pagar mais do que possivelmente torraram com bebida naquela noite; quatrocentos reais não é pouca grana;
- 9 decidiram prestar serviço comunitário; também gostei, pois terão que trabalhar de graça semanalmente, por 3 meses.

Apesar de toda a chateação, o desfecho foi satisfatório. Eles agora não podem cometer outra infração, sob pena de terem o nome fichado criminalmente. Isso significa que minha vizinha não irá nos perturbar pelos próximos 5 anos (prescrição do acordo, chamado de transação na esfera criminal). E significa também que foi dado exemplo e que os demais moradores pensarão duas vezes ao ultrapassar nosso limite de tolerância.

De tudo isso, duas pessoas me chamaram a atenção. Um dos rapazes, convidado da festa, insistia em dizer que eu estava certa, que a mãe o havia ensinado a pagar pelos erros, que ele estava errado e que pagaria, sim, mas que considerava um exagero eu ter chamado a polícia e insistir no andamento do processo. Um discurso bacana, mas contraditório. As manifestações eram mero retrato da juventude com que convivemos rotineiramente: uns não assumem o que fazem e quem assume, quer dar um jeitinho de se safar.

Outra pessoa que me chamou atenção foi o vizinho que chamou a polícia antes de mim, morador do andar de baixo do apartamento onde ocorreu a algazarra e que, assim como eu, foi arrolado como vítima. Tanto na noite que fomos para a delegacia, quanto na audiência, mostrava-se muito insatisfeito com o andamento do caso. Fiquei revoltada! É aquele tipinho de gente que se vê muito por aí, que não quer assumir nada, mas quer colher o bônus. Chamou a polícia por conta da barulheira da festa, mas não queria levar o caso adiante. Ora, essa gente quer que a polícia trabalhe pra eles e faça tudo sozinha. Quer que a justiça trabalhe pra eles e que faça tudo sozinha. Quer fazer cessar o que lhe incomoda, mas não quer sujar as mãozinhas. Sinceramente...

Fazer valer nossos direitos da trabalho, sim! Mas vale muito a pena! Você não é o rei da cocada preta para ter o mundo aos seus pés, trabalhando para que você possa usufruir os benefícios da lei. Crie vergonha nessa cara e bote a mão na massa! É seu dever. É seu direito! Não há benefício legal nenhum, não há direito previsto em lei, que venha sozinho até você. É claro que você pode não querer fazer valer seu direito. Mas também não pode reclamar e exigir exercê-lo sem que tenha feito por merecer.

Enfim, este é o recado da semana. Que você saiba que, não só na vida, mas no Direito e também na Justiça, quem persiste, alcança.

Por último um recadinho para a vizinha que me recebeu no Juizado Especial Criminal com aceno de mão e sorriso irônico na cara: e aí, fia, por último quem foi que sorriu melhor???? KKKK procê, nega!!!

Muita luz para todos nós!

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