Envelhecendo

- Ai, eu vô sentá. Num to guentano de dor.

Eu olho e vejo uma idosa mancando até o assento do ponto de ônibus.

- Qual o ônibus da senhora?
- 4801.
- Pode deixar que eu olho aqui.
- Brigada, minha fia. Eu tenho pobrema nas perna e nessaquí eu pus uma prota, mas esse trem dói demais.
- Imagino!
- Diz que esse negóçu de prota dói assim mess... Caus qui tem muito parafuso, né?!

Ela disse isso, passando a mão na perna, na altura do quadril, onde dava pra ver sob a roupa uma protuberância que imaginei ser a prótese.

Fico muito preocupada com o fato de que estamos caminhando para uma sociedade de solitários. Já somos uma sociedade velha. O número de idosos, em relação aos jovens, é muito grande e está aumentando. Envelhecer num país sem jovens, onde cada vez mais casais têm menos filhos, significa envelhecer sozinho, solitariamente, sem ter quem cuide da gente.

A senhorinha da “prota” aparentava ser alguém muito simples, simplória mesmo. E vê-la assim, andando sozinha, sentindo dor, me comoveu. Será correto essa prótese doer assim? E ficar tão protuberante sob a pele, é normal? Será que compreende tudo que o médico diz? Será que compreende as recomendações? Será que sabe onde buscar ajuda, caso a prótese esteja inadequada? Acredito que não.

Nossos idosos estão desamparados. Não falo pelo Governo, nem pela família. Desamparados de si mesmos. Passaram uma vida inteira sem se preparar para a velhice e, agora, têm dificuldade de lidar com informações e com tecnologia. Não raro atendo pessoas que não conseguem repetir o que o médico disse. Saem do consultório mais perdidos que quando entraram. E o que tem sido comum: idoso menos velho cuidando e acompanhando idoso mais velho, ambos sem qualquer preparo para cuidarem sozinhos de suas próprias vidas.

Em que bolha vivemos? Como é possível chegar a uma idade tão madura, sem maturidade para a vida, sem qualquer capacidade de compreender coisas tão básicas, mas tão importantes? Como viveu, criou família, com tamanho despreparo intelectual? Que adianta a luta pelos direitos dos idosos se eles não conseguem compreender nem a primeira frase de um texto simples, que dirá uma nota jurídica sobre como buscar um direito garantido pela lei?

E numa sociedade, como a nossa, cujo futuro é de envelhecimento solitário, precisamos de alguma forma nos preparar para isso, para sermos capazes de compreender as informações necessárias à nossa saúde e bem estar. E uma forma de fazer isso, é exigir, nas instituições das quais participamos, a existência de assistentes sociais à disposição do associado. Seja no sindicato, seja no Clube da Terceira Idade, seja na associação de bairro, precisamos de pessoas voluntárias ou remuneradas que possam ajudar o idoso a receber todas as informações necessárias para se cuidar.

Percebemos que muitos idosos não exercem seus direitos por desconhecê-los. Sequer sabem onde buscar informações. E, se por algum caminho, obtém a informação de que a lei lhe garante algo, trava diante do procedimento necessário: sabe que tem o direito, mas não sabe ou não consegue seguir o procedimento necessário para adquiri-lo.

O Direito é muito importante na vida das pessoas para garantia de uma vida digna, saúde e bem estar, mas não adianta não saber como utilizar isso. Envelhecer sem capacidade intelectual para compreender informações básicas necessárias à uma vida digna, coloca em risco não só nossos direitos, mas também nossa saúde. Num futuro bem próximo, não teremos familiares jovens disponíveis para traduzir informações e tecnologias. E aí?

E aí que precisamos nos associar a entidades que prestem serviço de assistência social a idosos, como clubes da melhor idade, clubes da amizade, grupos pastorais, e procurar cursos que dêem desenvoltura no uso do computador e da internet.

Atualize-se! 

Muita luz para todos nós!

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