Respeite o advogado criminalista!

Não é raro ouvirmos ataques à ética do advogado que defende criminosos. Chegam mesmo a dizer que quem faz defesa deste tipo de cliente é igual a ele. Será mesmo? Você, que defende tal ideia, tem a exata noção do que diz? Porque pra se meter em assunto tão complexo, você tem que saber o que é “ser criminoso”, o que é “ser advogado”, o que é “ética” e o que é “fazer uma defesa”. Para continuar defendendo seu argumento, você provavelmente vai dizer que sabe ou que, se não sabe, não importa!

Você não sabe o que diz! E importa sim saber o que está falando! E vou te demonstrar agora que além de não ter conhecimento de causa, você está errado em suas conclusões.

A Constituição Federal determina que ninguém será preso ou deverá ressarcir um dano sem o devido processo legal. Começa por aí: o princípio do devido processo legal. Ou seja, ninguém será condenado sem que tenha sido processado. E um processo, o processo legal, é: acusação, defesa, prova, sentença, recurso, acórdão, recurso, acórdão. Tem que passar por todas estas etapas para ser definitivamente condenado. Impossível ser condenado sem percorrer tal caminho. É assim: se tem acusação, tem que ter defesa; ambos tem que ter provas; só assim se tem a sentença. Somente se houver sentença é que se pode recorrer e se houver recurso tem que ter decisão (acórdão). E somente se houver acórdão, pode-se recorrer aos Tribunais Superiores e eles têm que dar a palavra final. A grosso modo falando, claro, não estou aqui dando aula para graduandos. Perceba que se não tiver um, não tem o outro. Se não tiver defesa, o processo para e não terá sentença. Se não houver sentença ou acórdão, não haverá condenação. Sem condenação, não haverá prisão ou ressarcimento de danos. Sem defesa, o criminoso não pode ser condenado e preso. É preciso que ele tenha garantido o direito de defesa, respondendo a todas as acusações que pesam sobre ele.

A defesa no processo jurídico somente pode ser feita por um profissional técnico habilitado para tal: o advogado. O criminoso tem que ter um advogado e se não tiver, o Estado paga um para ele (defensor público).

Então chegamos ao primeiro ponto: se o advogado não defender o criminoso, nunca será possível condenar o malfeitor e fazê-lo pagar pelo que fez. Não há nada de antiético, nem de imoral, nem de depreciativo em fazer a defesa de quem praticou um crime. Muito pelo contrário, é um grande serviço à sociedade, já que só assim é possível punir alguém. A falta de advogado de defesa é mais um fator que leva à tão discutida impunidade no país.

Mas não para por aí. Como falei, o assunto é complexo. É tema técnico. Não se trata de algo que se possa chegar á uma conclusão à base de mero blá blá blá, de opiniões leigas.

O segundo ponto é: quem é criminoso? O que é “ser criminoso”? O óbvio: cometeu um crime, é criminoso. Ainda que somente se possa dizer que a pessoa é criminosa depois de condenada, a gente já antecipa o julgamento e chama o “processado” (que responde a um processo) de “criminoso” (condenado pela prática de um crime).

Mas um dito criminoso pode ser um trabalhador. Pode ser uma boa pessoa. Pode sim! Se você atropela alguém e essa pessoa morre, você é um criminoso. É trabalhador, é gente boa e é criminoso.  Se você comprou um objeto sem saber a procedência e acabou por praticar a receptação, você é trabalhador, é gente boa e é criminoso. Se você responde a um processo com base na Lei Maria da Penha, você é trabalhador, não é tão gente boa quanto pensa que é e é um criminoso. Se você não paga a pensão alimento de seus filhos, você é trabalhador, não é gente boa e é um criminoso (abandono material de incapaz). Se você é o terror do bairro, vive no bar e mata sem dó quem te enche o saco, você não é trabalhador, não é gente boa e é criminoso. Se você vive de pequenos furtos, você não é trabalhador, não é gente boa e é criminoso. Não podemos colocar bandidos e criminosos no mesmo saco. Todo bandido é criminoso. Nem todo criminoso é bandido.

Criminoso, como já foi dito, é quem comete (na verdade, quem foi condenado por) um crime. Bandido é quem vive de crimes. Bandido é quem reiteradamente comete crimes. Por isso, é fácil encontrar um criminoso trabalhador. Alguém que cometeu um ato impensado num momento de fragilidade emocional ou de ira extrema. E que dificilmente fará isso de novo. O Bandido, não. Ele vive de cometer delitos, tem ficha criminal extensa, age friamente porque este é seu ofício, e é reincidente. Bandido pode até ser “gente boa”, porque tem uma lábia, um discurso muito convincente. Mas não é trabalhador. Não podemos tratar como igual um criminoso e um bandido! Um profissional que comete um erro e causa prejuízo ou a morte de alguém é criminoso, mas não é um bandido. E o que não faltam são exemplos de um e de outro.

Agora sim, ciente que para ser punido tem que se ter defesa jurídica e que apesar de bandido ser criminoso, criminoso pode não ser bandido, você pode dar sua opinião sobre a advocacia criminal.

Aliás, esta distinção entre bandido e criminoso nos ajuda também a entender o auxílio reclusão, que é pago aos beneficiários do criminoso, nunca aos beneficiários do bandido. É que o criminoso que estava trabalhando contribuía para o INSS e por isso, tem tal direito. O bandido, não. O auxílio reclusão é devido à família do criminoso, não à do bandido.

Mas e aí? Agora dá pra conversar. O que você pensa sobre advogado que defende criminoso? E o que você pensa sobre advogado que defende bandido? Acredita que seria melhor para a sociedade que advogados não defendessem criminosos e bandidos, deixando que estes fiquem sem defesa no processo?

Art. 133, da Constituição da República: o advogado é indispensável à administração da justiça, sendo inviolável por seus atos e manifestações no exercício da profissão, nos limites da lei.


Muita luz para todos nós!

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